segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Pena que não existe mais...

Na padaria, quarta-feira de cinzas. Dois conhecidos se reconhecem:

- Fulano?!

- Beltrano!

- E aí, como foi de carnaval?

- Ah, não ligo pra essas coisas...

- Sabe que eu também não?! Pra mim, é muita bobeira esse alvoroço todo. É sempre igual: Globeleza, desfile na TV, briga na apuração, essa bagunça na rua.

- Cê viu só que deu briga na apuração ontem novamente? Foi com aquela escola que fez mágica na pista?!

- Não, essa aí foi do Rio. A Unidos da Tijuca. A da confusão foi a Gaviões..

- Tá por dentro, hein?!

- A mulher vê. Aí, vejo também. Mas, não gosto, não.

- Rapaz, por falar em encrenca, você viu a confusão que aconteceu naquele bloco que passa na rua da prefeitura?

- Aconteceu do meu lado. Quase sobra pra mim. Tava com a minha esposa. Ela queria dar uma olhada na bagunça. Sabe como é, não podia negar.

- Sei, sim. Também acabei levando meu menino pra ver algumas dessas bandas antigas, sabe?!... aquelas que só tocam marchinhas. Tem um monte dessas. É bom pra ele aprender o que era carnaval bom. Coisa boa era na nossa época. Pena que não existe mais.

- Pois é... Não existe mesmo.

- Vou te contar uma teoria minha...

- Hum...

- Pra mim, tem três coisas que já acabaram há muito tempo e as pessoas não perceberam...

- Quais?

- Carnaval, natal e futebol.

- Verdade. Natal, então, nem se fala. Não tem mais aquela emoção toda que tinha quando a gente era criança.

- E não é porque a gente deixou de ser criança, não.

- Não... Claro que não. De jeito nenhum. Nem as crianças de hoje em dia ligam pra isso. Criança, hoje, não sabe nem o que é Papai Noel.

- Não mesmo. E esse negócio de encher as casas de luzinhas? No meu prédio, todas as janelas ficam enfeitadas, aquele clarão imenso. Papai Noel subindo em tudo que é apartamento, mas se você olhar no meu vai ver que não coloco absolutamente nada. Aquele clarão no prédio todo. Na minha janela, tudo preto... Protesto. Parece que não avisaram pra eles que o natal é coisa que não existe mais.

- E o futebol?!

- Palhaçada. Acabou também.

- Acabou mesmo.

Pequeno silêncio entre os dois. Observam atentamente a duas propagandas na TV da padaria. Uma anunciando o jogo do Corinthians e outra, a apuração das escolas de samba do Rio de Janeiro.... Depois de um tempo:

- Robinho joga amanhã?

- Claro... Não pode deixar de fora. Que coisa linda esse time do Santos, hein?!

- Pois é. Você sabe que sou palmerense roxo. Era, né. Isso na época que o futebol ainda existia. Quando os jogadores ainda torciam pelos clubes. Mas, esse time do Santos tá bonito de ver jogar.

- Bom, vou indo... quero ver essa novela das oito.

- Também to indo. Deve estar começando.

- Aliás, que porcaria de novela, hein?! E essa Luciana volta a andar ou não volta?

- Li numa revista, ali na banca, que vai ter até filho.

- Nossa. Esses caras inventam cada coisa.

- A gente se vê. Vamos combinar de ir no estádio qualquer dia desses.

- Vamos, sim... ô, anota aí...

- O quê?

- Novela...

- O que é que tem?

- Novela das 8 foi outra coisa que acabou, põe aí na tua lista.

- Boa... Anotado!

4 comentários:

Débora disse...

Deve ter sido divertidíssimo ouvir esse papo. Saudade d'ocês. Beijos da Débora

Lucy Lima disse...

Que pecado esse texto!
É tão bom que deve ter créditos para entrar no inferno.

Muito geracional...muito...

Voltei pra postar essa "amenidade", pois não consegui parar de rir.

Beijo,

Lucy Lima disse...

Retornei. Desta vez, além de elogios trago um recado. Dá uma passada de olhos nisso aqui: http://www.drogariadelivros.com.br/Regulamento.htm.

Quero ver mais textos seus impressos e com nome na capa.

Hasta,

orodeschi disse...

Caraca, muito bom! Um retrato de hoje pra guardar e mostrar pros filhos.

Abraço

Rachel Orodeschi