segunda-feira, 26 de outubro de 2009

O caso dos pombos

Gruuuuuu... Gruuuuuu...

Este foi o primeiro sinal de que não estávamos sozinhos. E, talvez, significasse um “sejam bem vindos” em pombês ou qualquer que fosse a língua falada pelos pombos.

Não sei quantos são. Só sei que habitam a caixa vazia de ar-condicionado do único quarto do apartamento e que, aos poucos, começam a se adaptar aos hábitos noturnos dos novos inquilinos. Estão sofrendo um pouco, mas irão se acostumar.

Nos primeiros dias, reclamaram bastante do liquidificador batendo às duas da madrugada e da luz ligada no quarto até quase o dia seguinte.

Berraram um ‘gruuu, gruuu’ agressivo, irritado. Pelo tom, pediam que parássemos com aquela barulheira e fossemos dormir, aquilo não era hora...

Lá pelas cinco da manhã, ao apagar a luz, ainda ouvimos um “gruu”, mais curto, rápido e vitorioso, como se o chefe da família dos pombos dissesse “e que isso não se repita!”.

Tenho nojo de pombo.

Lembro, sem nenhuma saudade, das tardes de domingo em que a família inteira ia para a Biquinha, aqui mesmo em São Vicente, para dar milho a essas criaturas.

Na praça, tinha um pombal enorme, parecia um prédio gigante com centenas de janelinhas. Era uma espécie de Copam dos pombos.

Os pais compravam saquinhos de milho dos ambulantes que rondavam a praça e as crianças se divertiam com aquilo. Eu achava nojento.

Mais do que aquelas dezenas de pombos cercando pobres crianças indefesas para reclamar da demora na entrega do milho e tentar roubar o saco inteiro sem mais delongas, eu sentia nojo do “gruuu, gruuu” que eles faziam.

Consegui a indicação de um produto que, aplicado na humilde habitação dos bichos, prende suas patas.

Depois de algum tempo, eles conseguem se soltar, mas ficam tão assustados que não voltam mais.

Fiquei impressionado com a inteligência do bichinho. Basta uma única punição para entenderem que estão errados e desaparecerem.

Um conhecido meu tomou três multas por excesso de velocidade no mesmo lugar. Se fosse um pombo, já teria aprendido.

Ao me ver no telefone, agitado com a pesquisa de preço do tal repelente, minha esposa fez a seguinte pergunta: “Mas pra onde eles vão se saírem dali? Não tem mais árvores por perto. Certamente, vão para outra caixa de ar condicionado ou parapeito de janela...”

É triste a ideia do despejo. Me veio à cabeça um trecho de Saudosa Maloca, os pobres pombos sendo despejados ‘indo pro meio da rua apreciar a demolição’.

Ela ainda deu o tiro de misericórdia no meu instinto exterminador: “eles têm um bebê agora... Ontem, quando abri a janela, ouvi um piadinho”. Pronto... Agora, a coisa ficou complicada.

Cedi... Pensei que poderíamos, então, fazer um teste. Pelo menos, até a criança deles ficar maiorzinha. Além do mais, nunca os vimos, eles ficam do lado de fora, não têm como transmitir doença alguma desse jeito.

Agora, estão lá, naquela espécie de puxadinho de menos de 1m².

Aos poucos, também vou me acostumando com a presença deles.

Já dou até bom dia quando abro a janela. E escuto um sonoro e feliz “gru, gru” como resposta.

Mas, não adianta, se dependerem de milho comprado na Biquinha, podem ter certeza de que vão morrer de fome. Com criança e tudo. E que se contentem em morar de favor na minha caixa de ar condicionado.

7 comentários:

Roberto disse...

Sempre achei aquele "copam dos pombos" uma das coisas mais nojentas e, ao mesmo tempo, impressionantes da minha infância. Acho que a arquitetura me fascinava.
Na casa onde morei a infância toda, uma vez apareceu uma casa de vespas bem em cima de uma das janelas. Com certeza um convívio bem menos pacífico
Abraço

Andressa Luzirão disse...

Pombos também me incomodam. Teimam em permanecer no meio das ruas e quase sempre são atropelados. Também não é nada agradável se deparar com um falecido estirado no asfalto. Mas o que mais me incomoda mesmo é o seu cheiro, o responsável por eu não ter mais apetite em comer o frangão assado de domingo. Ah, mas isso dá uma crônica. Argh!
Bjos.

Victor Farinelli disse...

Vui só como todo mundo tem um pinochezinho dentre de si? Sorte que tua esposa sabe como conter o teu ímpeto torturador.

Ademais, quando criança eu ficava imaginando como deveria ser lá dentro do "Copam dos Pombos". Pensei que era uma espécie de playcenter, com jogos, brincadeiras e muita alegria e diversão, onde só faltava a comida, e por isso eles saíam prá buscar o milho que jogavam...

... o resto é silêncio!

Átila Serdera disse...

Como tradicionalista que sou, sempre gostei de dar milho aos pombos, na Biquinha inclusive. Apesar de que o pombal me lembrava gavetas de cemitério. E é bom lembrar que essas aves têm muita magnetita no cérebro, e por isso foram muito usadas como pombo-correio, têm uma memória fantástica. Pra se ter uma idéia elas tem mais magnetita que o ser humano e o golfinho. Experimenta conversar com elas, quem sabe elas não entendam a situação e vão morar em outro lugar.

Mauro Castro disse...

Errei de lugar e deixei o comentário dos pombos no post de baixo - típico de um atrapalhado como eu.
Há braços!!

Gabi Mazza disse...

Bah, aqui nosso caso de amor e ódio é com os morcegos. Criaturinhas que se instalaram sem pedir licença entre as telhas e o forro de nossa casa. Um dia resolvi chamar a dedetização para acabar de vez com os mamíferos-arrepiantes. Surpresa a minha: é proibido dar cabo dos danados. O negócio foi acostumar com a sinfonia descompassada desses seres pouco simpáticos!

Ricardo Ribeiro disse...

Mas não é que eu tinha uns inquilinos assim quando morava em Santos. Também foi uma convivência engraçada. Foram embora de repente. Não sei bem porque. Vai ver não me aguentaram. Já alimentar aquela massa de pombos em praça pública, seja na biquinha ou em frente a basílica no Vaticano, sempre me pareceu meio nojento...